Somos o que sabemos sentir.

06-08-2024

Não é que eu seja a criatura mais inspiradora à face da Terra, porque não sou, mas posso bem concorrer para o pódio (não Olímpico, porque já não há paciência para nada que envolva hormonas, Sena, E. Coli e nadadores italianos a dormir no chão…) da mais interessada sobre o assunto.

Poupo-me, entre leituras inspiracionais e motivacionais, a alguns surtos e possivelmente a uma porrada de tentativas de homicídio qualificado. Cada um com o seu escape. Uma espécie de terapia low-cost à qual me dedico, com alguma regularidade para tentar absorver o melhor de mim e do mundo. Para tentar aprender a sentir, aprender a ser. Era isto ou vícios, e todos sabemos que a inflação não permite Veuve Cliquot sempre que nos falta ânimo ou inspiração, para minha triste sina.

Li algures que "somos o que sabemos sentir", tudo certo, voto a favor da ideia.

Porém, de acordo com uma lógica de raciocínio dedutivo, "Se somos o que sabemos sentir e se todos nós temos a capacidade de sentir tudo, temos a capacidade de ser tudo", o que é realmente fantástico de se ler e igualmente assustador, porque assim de repente, bate a ideia de que se calhar é melhor ter cuidado com o que despoleta sentimentos em nós…

Não sei quanto a vocês, mas eu não sinto só unicórnios, flores e arco-íris com glitters, em mim não coabita só uma Barbie sorridente e bem-disposta, partilho também o corpo com uma Annabelle que não paga renda e perfeitamente capaz de arrancar os olhos com uma colher de café a quem quer que seja, se for caso disso…e como eu, qualquer um de nós, obviamente (assumam e não sejam hipócritas).

A questão aqui é o que nos leva a estar e a ser mais pelo bem ou mais pelo mal?

Não é que tenha perdido horas a pensar no assunto, mas domingo passado, num fim de dia, com duas criaturas de quem muito gosto e com umas simpáticas garrafas de branco maduro fresquinho, demos por nós a discutir o tema.

Chegamos à conclusão que aquilo que nos inspira, aquilo que permitimos que a nós aceda e aquilo que procuramos saber, é sem sombra de dúvida o que determina a nossa predisposição e reação em relação ao mundo e ao nosso quotidiano.

O que nos desperta sentimentos é o que nos vai fazer ser, seja bom ou nem por isso.

Se te fizeres acompanhar continuamente de 9 retardados, muito provavelmente serás o 10º. O célebre "Diz-me com quem andas, dir-te-ei quem és" dos nossos avós, de postura irrepreensível, adaptado a estes tempos modernos e delicados de espírito, traduz-se num "tria toda a informação e energia que sobre ti se deposita, sob o perjúrio de sofreres as consequências disso!" ou algo parecido.

Não se tratou de uma epifania naquela discussão, eramos mais 3 bons amigos ao sol, com saudades de estar juntos, de copo na mão a falar uns por cima dos outros, mas a concluir em uníssono que independentemente dos 3 feitios distintos que temos (feitios todos eles incríveis e dignos de ovações em pé aquando da entrada nas portas dos céus, claro está!!) , das vidas, trabalhos, opções e condições, era denominador comum que a informação que absorvemos, seja ela pela convivência com outros, pelas redes sociais, pelos programas, pelos livros, pela rádio ou por meio de uma pomba correio enviada do Além…é mandatária na nossa forma de sentir e naquilo que desperta no nosso íntimo.

E o nosso íntimo tem tanto de bonito como de terrível. É o que é.

O que somos é determinado pelo que que sentimos, e, o que sentimos é determinado pelo que absorvemos, simples assim. Tão simples e urgente como a necessidade de triar aquilo que nos atinge.

Simples e normal devia ser, ao invés de estarmos preocupados em agregar conhecimento com tudo, de tudo e de todos, triar com peneira de rede fina, aqueles e aquilo que a nós acede. Não como uma manifestação de snobismo ou de elitismo, mas sim como um grito de autocuidado e preservação de bem-estar.

Ser educado(a) sempre, ser simpático(a) quando se tem vontade e com quem merece e ser acessível de forma criteriosa, elegantemente criteriosa, poupava-nos uma série de trabalhos de energias sugadas, semblantes carregados e desgaste de botox nas linhas de expressão mais profundas (e que se note que está ainda mais caro que Veuve Cliquot, portanto só em termos materiais o que isto já não dá de prejuízo…).

Perfeitamente evitável esta canseira toda, se normalizarmos e respeitarmos o afastamento daqueles com os quais já não se identificam com o nosso propósito e vice-versa, sem com isto gostar menos, sem com isto desrespeitar, sem com isto menosprezar nada nem ninguém.

Pura e simplesmente admitir e aceitar que nem todos vibramos na mesma frequência ao mesmo tempo, e por uma questão de prioridade, devemos optar por encher a mente, a consciência e até o inconsciente com aquilo que mais nos desperta interesse, necessidade e que melhor se coaduna com os nossos objetivos pessoais.

Isto não é querer mal a ninguém, nem achar que fulano é menos ou mais que beltrano, é apenas filtrar aquilo para o qual podemos canalizar a nossa energia, para que dela consigamos tirar o melhor proveito, porque infelizmente não é uma fonte ilimitada e caso não haja tento e responsabilidade no gasto, o resultado vai ser idêntico ao estourar de um cartão de crédito em lojinhas de "cacarelhos"…ficas cheia de nada, e a fatura está lá, para pagar mês seguinte. Trágico, no mínimo.

Sejamos seletivos na descarga de informação a que nos sujeitamos e sujeitamos os outros, trabalhemos esse filtro…para quê ser impactados ou impactar com um monte de informação que nos incomoda ou que não é nada mais do que ruído visual.

Podemos não ter consciência disso, mas na verdade há um microboombing por parte de cada pequena coisinha que nos entra retina dentro, que nos vai minando quando não se alinha connosco, que nos causa dano e que nada contribui para um maior bem-estar ou vida melhor…e aquilo que não acrescenta, só atrapalha.

Só hoje quantas interações já teve, email, redes, pessoalmente…quanto input informativo já sofreu? De todo esse, quantos foram os que lhe perguntaram por si ou acrescentaram ao seu estado atual animosidade? Dá que pensar.

Não tornemos este detox algo pessoal, é apenas e só proteção pessoal, calma e clareza…foco no que se quer absorver.

Voltando ao meu célebre domingo e à nossa conversa…um de nós inclusive contou um episódio caricato sobre alguém meramente conhecido que em dado instante, lhe cobrou num encontro aleatório um, "deixaste de me seguir nas redes" como se fosse quase um ato de declaração de guerra e desrespeito…e como se fossemos obrigados de forma permanente a aceitar no nosso feed e no nosso quotidiano uma série de fotografias e stories que não temos interesse de qualquer género.

Ou pior, o que seria se fossemos obrigados a aceitar alguém que facilmente percebemos que não é mais do que um voyeur cibernáutico que em nada se manifesta mas que está ali, a ver, porque vê, e quer ver o que tu expões para um grupo restrito...e uma vez tendo acesso, jamais poderá deixar de ter…sob pena de seres uma cruel pessoa.

Menos minha gente, vamos ser emocionalmente inteligentes e responsáveis, e normalizar os detoxs de perfis e da mesma maneira que se deixam de seguir páginas de restaurantes ( por exemplo) e não quer com isto dizer que queremos que fechem e abram falência. Fiquemo livres também para deixar de seguir alguém sem ser crucificados com um julgamento pequeno, resultado do ego ferido do cibernauta em crise e ou ficar plenamente tranquilos caso nos deixem de seguir a nós…ok?

O que seria, se não tivéssemos escolha no livro a ler, na série a ver, na comida a jantar, no desporto a praticar, nos destinos a conhecer…o que seria se não triássemos tudo de acordo com o que queremos para nós? E porque deveria ser diferente nas relações interpessoais?

O que seria?

É tempo de cuidarmos de nós, permitirmos que os outros se cuidem, e respeitar as escolhas de cada um, sem que com isso fiquemos melindrados.

Já era hora de deixarmos de ver as coisas pela lente pequena e permitirmos que cada um seja livre de escolher como se quer sentir, e no reflexo desta escolha permitir como quer ser em pleno.

Era hora de maduramente percebermos que temos o direito e a liberdade de escolhermos o que pretendemos sentir, sem explicações nem complicações. Simples.

Só pelo bem mesmo.

Hora de ter

cuidado com o próprio e com o alheio, fazendo parte ou não.

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